Letras Uneb/Ipiaú - Turma 2009.1

"O homem sentiu sempre - e os poetas frequentemente cantaram - o poder fundador da linguagem, que instaura uma sociedade imaginária, anima as coisas inertes, faz ver o que ainda não existe, traz de volta o que desapareceu". (Émile Benveniste)

7.12.09

ALUNA: SEBASTIANA BRITO DOS SANTOS


2° SEMSTRE VESPERTINO



CAPÍTULO III - A HETERONOMIA A QUE PAULO FREIRE SE OPÕE



3.6 - CONCEPÇÃO BANCÁRIA DA EDUCAÇÃO E A OPOSIÇÃO PROFESSOR/ALUNO



Exemplo de educação antidialógica é a "concepção bancária da educação" (FREIRE, 1983, p. 66), a qual mantém a contradição entre educador-educando (cf. idem, p. 67). A concepção bancária distingue a ação do educador em dois momentos, o primeiro o educador em sua biblioteca adquire os conhecimentos, e no segundo em frente aos educando narra o resultado de suas pesquisas, cabendo a estes apenas arquivar o que ouviram ou copiaram. Nesse caso não há conhecimento, os educando não são chamados a conhecer, apenas memorizam mecanicamente, recebem de outro algo pronto. Assim, de forma vertical e antidialógica, a concepção bancária de ensino "educa" para a passividade, para a acriticidade, e por isso é oposta à educação que pretenda educar para a autonomia.

Freire denuncia que a narração e a dissertação são características marcantes da educação bancária. "Narração ou dissertação que implica num sujeito - o narrador - e em objetos pacientes, ouvintes - os educando" (ibid, p. 65). Mantendo a contradição entre educador e educando, a narração não promove a educação: "narração de conteúdos que, por isto mesmo, tendem a petrificar-se ou a fazer-se algo quase morto" (IBID). Essa educação apresenta retalhos da realidade de forma estática, sem levar em conta a experiência do educando. "Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educando são os depositários e o educador o depositante" (IBID, p. 66). Por isso, Freire a chama de concepção "bancária da educação" (IBID, p. 67), em que cabe ao educando apenas ser depósito, arquivar informações. Mas, como nos fala Freire, "os grandes arquivados são os homens" (ibid), na medida em que essa educação sem práxis nega a criatividade, não há transformação, não há saber, os homens não podem tornar-se autônomos. A visão bancária possui papéis rigidamente definidos, o educador é o sábio que possui o conhecimento enquanto o educando é sempre aquele que não sabe. Em resumo, o educador é que educa, sabe, pensa, diz a palavra, disciplina, opta e prescreve a opção, atua, escolhe o conteúdo programático, identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, e finalmente, é o sujeito do processo. Os educando, ao contrário, são educados, não sabem, são pensados, escutam docilmente, são disciplinados, seguem a prescrição, têm papel passivo, não são ouvidos, devem adaptar-se às determinações do educador, e são meros objetos (cf. ibid, p. 66-67). Por isso, nessa visão distorcida de educação os homens são seres de adaptação e ajustamento. O problema é que quanto mais são tratados como depósitos, menos serão capazes de consciência crítica e de libertarem-se da situação de opressão. Essa educação autoritária inibe a capacidade de perguntar, poda a curiosidade (cf. FREIRE e FAUNDEZ, 1986, p. 46), gera um homem passivo, ingênuo, que não é capaz de um pensar autêntico. Assim, há a aceitação passiva das estruturas que tornam os homens seres para outro, heterônomos. Ela, em vez de transformar o homem em ser autônomo, de realizar sua vocação de Ser Mais, o torna autômato46, o que é uma forma de heteronímia.

A educação bancária mantém a "inconciliação entre educador-educando" (FREIRE, 1983, p. 71) e também sugere uma "dicotomia inexistente homens-mundo" (idem), na medida em que põe os homens como meros "espectadores e não recriadores do mundo" (IBID). Por isso, a educação bancária condiciona as pessoas para que se adaptem ao mundo, vivam nele aceitando a opressão sem se revoltar contra os patrões, os governantes, ou quem quer que possa os oprimir. Ou seja, para que trabalhem, cumpram as leis, sem questionar o próprio papel que ocupam na sociedade. Isso nega o homem como sujeito de suas ações e como ser de opção. Dessa forma, a educação bancária é educação como prática da dominação, mantém o educando na ingenuidade e assim, ele se acomoda ao mundo de opressão, permanecendo na heteronímia.

Ainda, a educação bancária com a pura transferência de conteúdos, a não participação do educando na produção do conhecimento, é um dos elementos responsáveis pela desmotivação, pela falta de interesse em estudar o que é "passado" em sala de aula (cf. FREIRE e SHOR, 1987, p. 15s). Freire chama a atenção para um produto genuíno da educação bancária, os altos índices de déficit quantitativo e qualitativo na educação, que constituem obstáculo para o desenvolvimento do país e para sua emancipação. Segundo Freire (1997, p. 11), o termo evasão escolar é ideológico, pois é posto de uma forma a dar a entender que as crianças estão fora da escola por vontade delas, mas na verdade elas são expulsas da escola, excluídas especialmente pela organização bancária. O termo correto é "expulsão escolar" (FREIRE, 1995, p. 46). Isso está relacionado ao despreparo científico dos educadores e a educação atrelada à ideologia elitista que alfabetiza não a partir da realidade do educando. Expulsar uma criança da escola é condená-la ao silêncio, se não tem como ler e escrever ou os faz de forma precária, não conseguirá manter relações verdadeiramente dialógicas em uma sociedade que existe pela palavra, dependerá de idéias e temas externos, e assim não conseguirá conquistar a própria autonomia.




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